A Volta dos Que (nunca) Não Foram - Talibã

16/08/2021 14:28

            O assunto agora é Afeganistão, ou melhor, talibã.

            Estamos em choque, mais um, de um 2020 prolongado abrindo a nova década do século XXI que insiste em não nos deixar. Mas o ano é 2021, perfazendo as inquietações iniciadas no ano anterior com a pandemia do novo coronavírus. Diante deste cenário, assistimos a ascensão política intolerante e nacionalista em vários países, o mais recente no Afeganistão.

            Entre tantos textos que leremos e debates para esclarecer o porquê deste retorno do talibã no território afegão, exponho o tema religião e fanatismo, incorporados no sistema de vida dos muçulmanos afegãos.

            O talibã, como regime autoritário muçulmano, também pode ser denominado de fanatismo religioso, intolerância contra tudo que é diferente dos seus pensamentos e comportamentos, atraso, desumanidade, destruidor histórico, paladino do califado muçulmano. Lembrando que o talibã é formado por pessoas de tribos diferentes, mas se identificam com o mesmo regime a ser implantado, quer dizer, replantado no território de suas origens étnicas. Aliás, as etnias possuem algumas distinções convivendo no mesmo território geopolítico, são: pachtuns, yusufzai, afridi, khattak, dadicae, ghilji, tadjique e hazara.

            Assistir o retorno do talibã é lembrar que nunca saíram da região; não foram destruídos e muito menos seus ideais. Silenciosamente continuaram a se reunir, a guardar suas armas e manter contato com o domínio ocidental em sua região. Não pensam e não desejam a democracia ocidental, a deles é baseada na jurisprudência islâmica, como na Arábia Saudita, no Irã, Egito, entre outros países majoritariamente muçulmanos. O Alcorão é o livro divino, deve-se segui-lo e criar um sistema cuja base se orienta por seu texto sagrado.

            A leitura e interpretação do texto corânico e da suna, permitiram a existência de várias ramificações islâmicas oriundas do sunismo do século VII. Após a morte do profeta Mohammed (ano 632 EC), seus sucessores formaram califados, constituindo integridade às observâncias do profeta na expansão do islamismo. É difícil para nós compreendermos a separação do político e religioso no islã, pois o político é percebido como o propulsor das investidas do islamismo. A mentalidade e proposta política ocidental dissociadas da religião, não podem ser interpretadas no mesmo viés para a realidade islâmica. O islã é um sistema de vida, mesmo em países do Golfo Pérsico, região próspera, assistimos mulheres árabes com seus hijabs pretos, homens árabes com trajes étnicos, nunca de bermudas ou camisetas “mamãe tô forte”; é uma afronta ao islã quebrar estas regras. É o sistema religioso com suas estacas na política.

            Por que o talibã nos assusta mais do que uma Dubai, Riad, Teerã ou Cairo? Vou expor dois pontos – sabendo da existência de mais – a restauração do califado e o trato intolerante com tudo que significa ocidental. Em relação ao califado, pensam os talibãs serem os descendentes legítimos do Profeta na preservação da ordem e o céu na terra. Os três primeiros califados, Ortodoxo, Omíada e Abássida, se constituíram como seguidores oculares ou descendentes diretos do Profeta. Estes califados prosperaram o Império Árabe e expandiram o islamismo. Restaurar significa voltar as raízes da ordem medieval da pujança do islã. Na sequência, a intolerância é praticada para estabelecer a ordem: mulher totalmente coberta a serviço de seus maridos; meninas em casa aprendendo a vida doméstica como sua única possibilidade de se distanciarem da perversidade da vida moderna; madrassas preparando os meninos na liderança da fé e da política; destruição de símbolos históricos do passado considerados pagãos e impuros e rejeição aos diferentes, sejam quais forem.

            A volta do talibã é a manutenção do obscurantismo caracterizado por milhares de fugas e mais imigrantes pedindo socorro. Que minha casa possa recebê-los, pois “fui estrangeiro e vocês me acolheram” (Mateus 25:35).